quarta-feira, julho 18, 2007

Verão

Cansaço. Vem-me à memória o tempo fácil do verão marcado na pele. Nem tudo era assim tão simples mas a felicidade vinha muito mais depressa e o esforço, certamente, era menor. Sinto falta do tempo. Agora passa sempre a correr, dantes sobrava! Arrastava-se por entre brincadeiras tão preguiçoso como o sol no céu, sempre lá no alto a marcar o passo da nossa felicidade. Dias de tudo em que não se fazia nada. Plenitude. A casa da minha avó. O medo das lendas, o frio na espinha quando corríamos para fugir de personagens encantadas. Ler um livro na cadeira de pano, pés no mármore, abrigada do sol que queimava a pele até na sombra! As brincadeiras na escadaria, a pedra sempre fresca que nos dava abrigo, as patas do Snoppy marcadas no cimento. Correr na varanda e a minha avó a gritar pelas plantas, juro que era capaz de nos ouvir em qualquer parte da casa! Sempre atenta e vigilante, tomava conta de nós, dava-nos mimos. Lembro-me de ficar na cozinha quando ela estava a cozinhar, acho que foi aí que lhe tomei o gosto!, sempre a lamber o que ficava nas formas e a roubar dos tachos quando ela não estava a olhar! O Leandro, meu companheiro de brincadeiras, tanto que me aturaste meu querido!, queria ser sempre eu a fazer tudo. O quintal era o nosso domínio – inventávamos histórias mirabolantes, nunca nos aborrecíamos! Escavávamos, explorávamos, ninguém nos parava! E o Snoppy… nunca vi um cão tão dócil, era ele também nosso companheiro. Cresceu connosco, defendia-nos sempre, deixava-nos fazer tudo dele… era cão, cavalo e amigo. Depois veio a Faísca, já mais independente (como todos os gatos) mas a ti, meu bom Leandro, ela confiou a sua ninhada! Lembro-me do meu quarto, primeiro o grande com o brasão no tecto e mobília imponente para mim tão pequena – tinha sempre medo de ir para a cama à noite! Depois o quarto ao lado do dos meus avós, mais pequeno (pertencera em tempos ao meu pai), esse sim, já inteiramente meu – ainda hoje consigo sentir o seu cheiro! Lembro-me dos almoços e jantares era uma animação, a casa sempre cheia era uma alegria imensa! Lembro-me de ir tomar café à cidade depois de jantar, de ver os jogos sem fronteiras no sofá da sala à noite. O Leandro ficava sempre preocupado quando o avô adormecia a ver tv com a cabeça ligeiramente inclinada, tinha medo que ele partisse o pescoço! E no Natal… aquela casa era o nosso aconchego. A neve a cair lá fora e a lareira quentinha cá dentro, o cheiro de rabanadas e filhoses, os chocolates pendurados na árvore. Os carinhos da avó, minha querida avó. És o nosso refúgio! Contigo sabíamos que estava sempre tudo bem até mesmo quando ralhavas connosco! Aquela casa, a minha infância. Dias, meses, anos de felicidade. Ali era onde a paz e o caos de uma família reinavam em harmonia. Ali éramos família. A minha felicidade cabe toda naquela casa. Tenho saudades. Não como quem quer de volta – isso seria inútil – mas saudades como quem recorda um sítio onde foi feliz de uma felicidade eterna e irreprodutível. Aquela casa, a minha família, a minha infância.

Verão… nunca mais será o mesmo.